“Já contei essa história tantas vezes e ninguém quis me acreditar. Vou agora contar tudo especialmente pra senhora, que se não pode ajudar, pelo menos não fica me atormentando como fazem os outros”. Assim começa a narradora-personagem de “A Confissão de Leontina”, conto da Lygia Fagundes Telles que retrata uma realidade muito brasileira: uma menina pobre, Leontina, nascida numa pequena cidade do interior (de nome sugestivo, Olhos d’Água), que foge para a cidade grande. Pouco letrada e “sem ter quem com ela se preocupe no mundo”, trabalha como dançarina de aluguel. Sofre as agruras da metrópole, até parar atrás das grades, de onde ela passa a narrar sua trajetória.

O texto literário de “A Confissão de Leontina” não foi adaptado: a estrutura narrativa já se encontra pronta para se tornar um monólogo. O foco da montagem está no trabalho da intérprete de explorar as diversas camadas deste belíssimo texto literário. 
A proposta é que a atriz se aproprie e dê voz ao texto, para que, do mergulho nas palavras, brote sua profusão de imagens e, assim, se presentifique cenicamente a persona de Leontina e sua comovente história.

Uma das primeiras versões do conto “A Confissão de Leontina” foi publicada no “O Cacto Vermelho” (1949; Prêmio Afonso Arinos,da Academia Brasileira de Letras);a versão usada na peça é a do livro “A estrutura da bolha de sabão” (1978), é um dos contos preferidos da escritora; entretanto, assim como acontecera com outra importante obra da escritora, o romance “As Meninas”, a história continua extremamente atual.  Nesse texto, o universo de Lygia, segundo Caio F. de Abreu, composto pelo “sangue inevitável das dores da condição humana e a talvez redentora aceitação […] da insignificância e humildade que essa condição impõe”, está escancarado nas palavras de Leontina.

A Confissão de Leontina cuja estréia ocorreu em julho de 2008 no SESC Consolação, cumpriu temporada (09 dias) até o dia 16 de setembro, sempre às terças. Na sequência, foi apresentado no Teatro Ágora entre os meses de novembro e de dezembro, de sexta à domingo do mesmo ano, perfazendo um total de 21 sessões. Em ambas temporadas obteve sucesso de público e crítica. Em 2009 se apresentou no Club Athlético Paulistano e na Virada Cultural de Santos/SP. Em 2010 se apresentou no Ponto de Cultura Casa da Gioconda no bairro do Bixiga e no Festival de Presidente Prudente/SP XVII FENTEPP. Em 2014 teve curta temporada de 05 de Abril à 04 de maio, todo sábado 22h e domingo 17h, na Cia do Pessoal do Faroeste – Sala Umberto Magnani. Nas duas primeiras temporadas tivemos a honra de contar com a presença da escritora Lygia Fagundes Telles com seus 88 anos. Em 2015, foi contemplada pelo Proac Circulação e pelo Prêmio Zé Renato Pécora, nos âmbitos estadual e municipal, e circulou por 20 espaços de coletivos da cidade de São Paulo, e por 20 localidades do interior: assentamentos, aldeias, quilombos, movimentos sociais, associado à oficina Em Contato, em que o Grupo Xingó compartilhava os conhecimentos em educação somática e contato improvisação de forma gratuita.

"Um dos atores destacados de sua geração, Marat Descartes tem uma presença cênica intensa. Interioriza o papel e o devolve em gestos precisos, com uma tensão bem medida. Nada de espalhafato, de ruido verbal. Muito da sua atuação está no olhar. É um profissional interessado em outras variantes da sua arte. Estas características e qualidades o levaram a direção teatral, e ele demonstra talento em A Confissão de Leontina, comovido e comovente conto de Lygia Fagundes Telles. A mesma sobriedade que o caracteriza atuando, está aplicada na encenação. Leontina é um espetáculo de luz e sombras totalmente dedicado a realçar o texto e usar o melhor da capacidade dramática da boa atriz Erika Moura que, assim, faz brotar todo desencanto e toda carência desta mulher que só conheceu desamparo na vida. Foi um dos acontecimentos fortes na temporada de 2008.
Jefferson Del Rios
Temporada Sesc Consolação - 2008
"Leontina, revivida agora depois de trinta anos desde que foi criada por Lygia Fagundes Teles, é prima-irmã de outras tantas. (...) qualidade potente da atuação de Erika Moura, que encontra no Brasil campo fértil para inspirar a sua pesquisa atoral. Mas, não há dúvida, através do espetáculo é possível intuir que esta Leontina, irmã da Macabéa de Clarice Lispector e da Iracema de Jorge Bodansky, (...) é a personificação do miserável e do migrante ingênuo que, em meados dos anos 70, ganhava representação em chave compassiva, ficando o dado de indignação por conta de uma mediação “extra”. É curioso observar como funciona esta mediação, feita pela escritora ou pelo cineasta. Para se manterem fiéis ao objeto sem perder a chance de criticar o contexto em que ele se punha eles precisaram inventar artifícios de linguagem que compensavam o dado de alienação das personagens. (...) A denúncia, como nos outros casos, está lá, mas falando por si, totalmente centrada na voz e na história da personagem. E é sobre este solo não revolvido da narrativa original que Erika Moura faz o seu excelente trabalho. Usando da licença poética necessária ao monólogo e sem a qual a situação seria inverossímil, ela nos coloca no lugar da interlocutora - para nós imaginária - e opera a sua tarefa de caracterização realista daquela “inocência pisada” da miséria anônima vivída em uma cidade “toda feita contra ela”, como dizia Clarice Lispector. E o faz inteiramente, com muita atenção aos estados que vão brotando dos momentos diferentes que a dramaturgia põe à mesa, tornando aceitável a costura sempre difícil entre o narrar e o viver a personagem. Erika transita firme pelos caminhos tortuosos que vão da inocência ao desespero, neste último caso sem apelo ao melodramático e atenta a algo que atores menos experientes dificilmente alcançam porque isto exige uma sintonia fina para a ação: identificar a potência do patético na situação trágica, o grito fundo e quase surdo que dispensa as lágrimas e o ranger de dentes . Nesta área é quase possível ver, de mãos dadas com a atriz, o diretor Marat Descartes, que fez recentemente um Beckett (Primeiro Amor) também comovente e amparado nesta atenção preciosa ao estado da personagem, capaz de se desvencilhar da literatice que sempre sobra como resíduo em textos adaptados, e de substituí-la por uma vivência não cerimoniosa do texto. (...) Leontina, Macabéa, Iracema. Hermila (Suely), Meire Love...
Kil Abreu
Festival Presidente Prudente - 2010

LUZ:
O espetáculo será adaptado aos espaços dos coletivos e suas condições técnicas, pois pode ser feito de diferentes maneiras, pra além da concepção original de luz e cenografia.  Temos uma concepção alternativa de iluminação, que se resume a luzes de led em tripés para “lavar” a semi-arena, e um soquete com a luz central que faz parte da dramaturgia. Nas comunidades rurais, em escolas e áreas abertas, será feito em arena, contemplando maior número de espectadores. No teatro, quando houver as condições necessárias, temos o mapa completo abaixo.

Mapa de Luz

SOM:
Este espetáculo não necessita de equipamentos de som.